sábado, 24 de outubro de 2009

Memorização e cálculo - Nova Escola

Resultados de memória são essenciais aos procedimentos de cálculo. Ensine à turma boas formas de decorar - e de fugir da decoreba
Bianca Bibiano
mailto:bianca.bibiano@abril.com.br)
USO SIGNIFICATIVO Com jogos de tabuleiro, a turma da Escola Balão Vermelho exercita contas que já conhece. Fotos: Leo Drummond
Memorizar resultados nas aulas de Matemática pode não ser a melhor recordação da escola. Para muita gente, o que vem à mente são os calafrios da temida hora em que a professora tomava a tabuada, o que exigia insistência e esforço para decorar os cálculos cobrados na chamada oral. É verdade que esse tipo de decoreba está longe de ser a maneira mais adequada de ajudar a turma a avançar nos cálculos. A memorização foi, por muito tempo, relacionada à repetição. Isso não significa, porém, que ela não seja um recurso importante na hora de fazer contas. "Muito do que é trabalhado nas aulas depende desse repertório. Com ele, os alunos seguem para outros cálculos mais complexos", diz Priscila Monteiro, coordenadora da formação em Matemática da prefeitura de São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, e formadora do projeto Matemática É D+.
Dentro dessa perspectiva, as atividades de memorização de repertório devem integrar o trabalho mais amplo com cálculo mental. O ideal é que elas façam parte das últimas etapas, na fase de sistematização do que foi aprendido. Isso significa que a ação de decorar resultados está mais para ponto final do que para pontapé inicial dos trabalhos. No conteúdo, os especialistas reconhecem diversas práticas em sala de aula. O matemático espanhol Carlos Maza Gómez observa no livro Multiplicar y Dividir - A Través de la Resolución de Problemas que o trabalho com a memorização ocorre de três maneiras: a primeira aponta para a repetição de resultados até que eles sejam guardados na memória, enquanto a segunda se dá quando os resultados fazem parte de uma sequência - por exemplo, decorar a tabuada do dois, depois a do três e assim por diante, criando relações entre elas. Para o autor, esses dois caminhos, que predominaram nas escolas durante boa parte do século passado, não são os mais adequados. A "terceira via", proposta por Gómez, consiste em fazer com que o aluno decore os resultados sem criar vínculo com a sequência - e, claro, apenas depois de entender o cálculo (
leia o currículo e a sequência didática sobre esse tema). Um exemplo concreto com o uso da tabuada do sete
DE OLHO NAS REGRAS Perceber no caderno que os resultados seguem um padrão ajuda na hora de decorar
O matemático argumenta que a estratégia tradicional de ensinar os cálculos em sequência atrapalha os estudantes. No caso específico da multiplicação, pesquisas sobre memorização demonstram que a maior proporção de erros ocorre justamente quando o aluno confunde uma conta com outra que se parece com ela. No caso da tabuada do sete, por exemplo, são comuns as trocas entre os resultados de 7 x 8 e 7 x 9, pois um dos fatores é igual (o 7) e os outros são bem próximos (8 e 9). Para Gómez, o ideal é que o aluno faça a memorização aplicando raciocínios distintos para cada item da sequência. A base para esse trabalho é o conhecimento das propriedades das operações (especialmente a comutativa) e de regularidades previamente estudadas (multiplicação por dez, o cálculo do dobro e da metade etc.). Uma vantagem adicional - e nada desprezível - é que a classe encontra sentido no conhecimento que aprendeu. É possível usar essa estratégia na memorização da própria tabuada do 7. Sete vezes 0 e 7 x 1 são cálculos cujas regularidades a turma vai notar em todas as outras tabuadas - qualquer número multiplicado por 0 dá 0 e qualquer número multiplicado por 1 dá ele próprio. No cálculo de 7 x 2, pode-se tanto usar a adição (7 + 7) quanto a propriedade comutativa (2 x 7), caso o aluno já tenha decorado a tabuada do 2. Para 7 x 3, uma opção é somar 7 ao produto de 2 x 7 (14 + 7). No 7 x 4, usa-se o dobro de 7 x 2. Sete vezes 5 pode ser entendido como a metade de 7 x 10 - mas, como essa é uma multiplicação facilmente memorizada, pode servir de ponto de partida para outras, como o 6 x 7, somando 7 ao produto de 7 x 5 (35 + 7). Em 7 x 7, a conta pode ser feita usando soma reiterada (adicionar o 7 duas vezes com base no resultado de 5 x 7) ou somar uma vez ao 6 x 7, se o estudante já tiver memorizado esse resultado em atividades anteriores.
ESTE É O CAMINHO Cada um conta à turma quais procedimentos seguiu para conseguir memorizar o resultado
No cálculo seguinte, 7 x 8, aplica-se novamente o dobro (2 x 7 x 4). Em 7 x 9, uma possibilidade é a subtrair 7 do produto de 7 x 10 (70 - 7). A propriedade comutativa também ajuda, pois 10 x 7 é um resultado quase imediato - somente acrescenta-se o 0 ao 7. Outra alteração importante é a maneira de aplicar a memorização em sala. Sai a chamada oral e entram atividades em que a turma tenha a necessidade de saber os cálculos de cor. Na escola Balão Vermelho, em Belo Horizonte, a turma do 3º ano da professora Kátia Mendonça Santos Siuza trabalha com jogos. Para decorar resultados, cada aluno participa com uma peça no tabuleiro. Em um baralho, tiram cartas com os números e a operação que deve ser realizada. Acertando, pulam o número de casas que deu na operação. Por fim, vale lembrar que, assim como na construção de procedimentos de cálculo mental, a socialização das estratégias que levam ao repertório memorizado também é fundamental. O que já está decorado deve ganhar espaço no caderno ou em cartazes que sirvam como registro. Se você caminhar por essa trilha, o necessário trabalho de decorar resultados tem tudo para acontecer sem os calafrios que costumava provocar no passado.

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